Livro Mandinga em Manhattan: Como a Capoeira se espalhou pelo mundo
Quando, a hoje jornalista, escritora, fotojornalista e capoeirista Lucia Correia Lima vivia seus 15 anos, o Brasil vivia em plena ditadura militar. Em 1968 foi levada por colegas do Movimento Estudantil Secundarista para treinar capoeira, na escola do Mestre Suassuna, no centro de São Paulo, aonde chegou “exilada” com seus pais militantes humanistas, fugidos da Bahia para abrigo na imensidão da maior cidade da América do Sul. A luta-arte afro-brasileira era uma “arma” para enfrentar os tempos cinzentos que se instalou no país por vinte e cinco anos.
Semelhante aos pioneiros capoeiras do século XIX, Lucia é presa com 16 anos, pois alguns de seus colegas aderem a romântica e suicida “luta armada”, contra a ditadura. Muitos foram mortos, exilados ou presos. Seu mestre Suassuna, um deles. Mas Lucia discorda da luta armada vai trabalhar na revista Realidade, da Editora Abril, quando na equipe da edição Amazônia, recebe o prêmio Esso de Jornalismo. Em seguida inicia carreira na chamada imprensa alternativa, quando compondo a equipe da revolucionária revista Bondinho, recebe o Esso de “contribuição à imprensa”. De volta à Bahia, atua nos principais jornais de Salvador, como a Tribuna da Bahia e Correio da Bahia, assina textos e fotos. Deixa na imprensa baiana sua marca quando opta pelo fotojornalismo. Período em que passa pela sucursal baiana de O Globo e retorna à capoeira.
Indo morar no Centro Histórico da primeira capital do Brasil, se inscreve para as aulas do lendário mestre João Pequeno de Pastinha. Lá surge o livro Mandinga em Manhattan. A escola do velho mestre estava repleta de jovens de todos os continentes. A capoeira, já no meio da década de 1990, trazia ao Brasil jovens de todo o mundo, mas, poucos sabiam que junto ao Candomblé e o Samba, havia se transformado uma das mais importantes manifestações da cultura brasileira.
A capoeirista e jornalista vive esta expansão, realizada sem nenhuma ajuda governamental, embora a UNESCO recentemente tomba a “roda de capoeira” como patrimônio mundial. No período em que Lucia Correia Lima pensa o livro, este tema era uma extravagância. Lucia teve que dar uma rasteira no preconceito e transforma sua ideia em um documentário: cria o título Mandinga em Manhattan e recebe o prêmio nacional DOCTV. Do Mistério da Cultura. Em 2008.
A ideia do livro retorna com a transcrição das longas entrevistas do documentário. Com o mesmo título, a publicação é selecionada pelo edital Capoeira Viva, também do MinC. Depois de novas entrevistas e enfrentamento da burocracia nos órgãos públicos, finalmente o trabalho é editado. Contem vinte e uma entrevistas com os pioneiros mestres responsáveis pelo espalhar a capoeira pelo mundo. Além de estudiosos como o Dr. Ubiratan Castro, do escritor Ildázio Tavares; da etnomusicóloga Emília Biancardi, da etnolingüista Yeda Pessoa de Castro, dos ex-ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira, entre outros.
Fundamental no livro de Lucia são os depoimentos dos mestres que fizeram da capoeira sua fonte de trabalho e pesquisa. Jelon Vieira, abre a primeira escola de capoeira em Nova York em 1975. Entra para a história da luta-arte afro-brasileira; o Mestre e médico Decâneo, dá sua última entrevista em vida; Camisa é um “boing” que viaja pelo mundo, sendo recebido com reverência; Suassuna perdeu a conta de quantos grupos tem fora do Brasil; mestre Amém, levou a capoeira para a poderosa indústria do cinema de Hollywood; Acordeom colocou a capoeira nas mais tradicionais universidades da Califórnia, e muitos outros. Entre as falas dos estrangeiros estão o sociólogo Kenned Dossar, o antropólogo Greg Downey, aluno de mestre João Grande, recebido na Casa Branca, para homenagem.
O trabalho da baiana foi produzido pela Fundação Gregório de Matos, de Salvador, está sendo distribuído por diversos países via os grupos internacionais. Foi lançado em Salvador; na escola do MST de Vitória da Conquista, em Inhambupe e será apresentado em evento internacional com capoeiras de mais de 60 países, de 9 a 13 de agosto deste ano, nos 50 anos da escola Cordão de Ouro em São Paulo. No clube da Eletropaulo, com programação no site. No dia 11, sexta feita as 15hs Lucia Correia Lima fará palestra sobre a concepção do livro e documentário Mandinga em Manhattan, este um prêmio do DOCTV, administrado pela Fundação Padre Anchieta de São Paulo. No Rio de Janeiro, o livro será apresentado na escola Abadá Capoeira de 23 a 27 de agosto. O trabalho deve ser relançado em Salvador ainda em 2017. Ainda em agosto deste ano a autora foi convidada para lançar seu trabalho em Santo André, também com palestra e exibição do documentário.
Jolivaldo Freitas – Jornalista
DRT: 1241-BA
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