Mestre Alexandre Batata: A palavra do Mestre – Graduações
Entrevista de Maíra Gomes retirada do Blog: Capoeira de toda maneira.
Uma das grandes discussões dentro da Capoeira é a questão da graduação. Muitas escolas desenvolveram seu próprio sistema, outras adotam o sistema de cordéis criados por Mestre Mendonça, há também o sistema da ABCP – Associação Brasileira dos Professores de Capoeira e não ter uma unificação ainda causa muita confusão. É aluno tirando mestre no jogo de compra, mestres sendo formados sem merecimento/tempo/história, grupos com sete graduações, outros com 20, nomenclaturas diferentes como grão-mestre, mestre mór, mestríssimo, enfim, ter um só padrão hierárquico facilitaria, mas é só isso?
Na semana passada enviei para alguns mestres a seguinte pergunta: O que o senhor pensa sobre os diversos sistemas de graduação existentes da capoeira? A graduação deveria ser padronizada para todos os grupos?
A primeira postagem da série é especial, um panorama geral sobre as graduações ao longo da história da Capoeira. Com a palavra, Mestre Alexandre Batata:
“Maíra Gomes perguntou:
– Mestre, estou fazendo uma pesquisa, o senhor acha que os capoeiristas deviam usar a mesma graduação?
Aí… eu respondi:
– Queria poder responder a tua pergunta com um simples sim ou não, porém, pelo carinho que tenho por seu lado de investigadora (jornalista), resolvi abordar o tema.
Este assunto vem em bom momento histórico, a morte do Mestre Damianor de Mendonça. Vamos a história!
Poderia começar lá nos tempos ancestrais, da proposta no sistema hierárquico tribalista, onde o tempo por si só determinava o respeito: criança, jovem, adulto e velho, mas vou dar um pulo e vamos ao século XIX.
As maltas cariocas, aquelas da época descrita como A ERA DOS VALENTÕES por alguns historiadores, tinham um sistema de nomenclatura hierárquico. As crianças, que já tinham algumas funções na malta, eram os CARRAPETAS. Os adultos eram CAXINGUELES, CAPOEIRA AMADOR, CAPOEIRA PROFISSIONAL e CHEFE DE MALTA. Perceba na hierarquia adulta os quatro tempos.
Mestre Bimba, aquele famoso baiano que em mais uma estratégia sincretista da capoeira criou a LUTA REGIONAL BAIANA, criou um sistema de graduação com QUATRO LENÇOS.
Durante a ditadura militar, com Presidente da República General Garrastazzu Médici. período mais agudo da Ditadura Militar, em 1968 havia sido publicado o Ato Institucional número 5, que suspendia direitos políticos, institucionalizava a censura e dava amplos poderes ao governo militar. Foi entre os anos de 1968 e 1973 também que o Brasil viveu o chamado Milagre Econômico, período no qual o país cresceu economicamente em níveis altos.
Havia um lema: BRASIL, AME-O OU DEIXE-O!
A capoeira em mais um sincretismo político entra nos “moldes”. Se filia ao Conselho Nacional de Desporto através Confederação Brasileira de Pugilismo e nos estados passa a ser dirigida pelas Federações de Pugilismo. Se não me engano, Rio, São Paulo e Bahia.
No Rio de Janeiro, Mestre Damianor de Mendonça criou o sistema de graduações de cordéis, nove fios trançados em três, cada três representava uma trindade. Não me recordo bem mas uma delas era O PAI,O FILHO E O ESPÍRITO SANTO. A ditadura era católica e para representar a hierarquia usa as cores da bandeira Brasileira, ou seja, do pavilhão nacional: verde, amarela, azul e branco. Olha os 4 de Novo. Tudo na mais perfeita ordem e progresso.
Uma curiosidade
A graduação era verde, verde e amarelo, amarelo, azul e amarelo, azul (Instrutor) verde -amarela-azul.(Contramestre) branco e verde ( 1º Grau de Mestre) , branco e amarelo (2º Grau de Mestre, 10 anos de Mestre), branco e azul (3º Grau de Mestre, 20 anos de Mestre) e o branco (3º e último estágio, 30 anos de Mestre).
No Rio de Janeiro foram graduados: Mestre Artur Emídio (CORDEL BRANCO), Mestre Djalma Bandeira cordel (Branco e azul), Mestre Luiz Américo – Mintirinha (CORDEL BRANCO E AMARELO) e a todos os outros Mestres, o CORDEL BRANCO E VERDE.
Mas, no começo dos anos 1980, surgem as federações de Capoeira. Aí bagunçou. Eu explico:
Com o intuito de formar uma Confederação Brasileira de Capoeira. As federações convidam todos os capoeiras a prestarem exames, criam-se seminários, palestras, cursos e outros blá-blá-blás.
Havia uma ameaça que os professores de Educação física tomassem o monopólio, conversa fiada. A capoeira estava engatinhando, já era matéria na Universidade Federal do Rio de janeiro e mais tarde na Gama Filho (particular).
Vamos falar do Rio, tá?
Na Primeira banca examinadora, mestres já renomados se predispuseram a colaborar. Provas escritas, exames de competência, alguns discordaram, mas a maioria participou. Parecia que ia funcionar.
Até então havia uma ética, os mestres sabiam quem era quem.
Como diz o Mestre Bocka: “Não havia código escrito e nem sempre era por telefone, porque muita gente não tinha. A gente se encontrava e perguntava, ‘Aquele seu aluno…….?’ ”
Mas surge a 3ª banca examinadora e começa a venda de cordéis.
Vamos voltar as graduações, a ideia do cordel era boa, mas o material por si só era complicado.
Quem tinha “meia dúzia” de alunos trançava na boa, dava um trabalho danado.
A Senzala, grupo que sempre foi referência, explodia na época.
Um designer de calça criado pela Quitéria deixa o capoeira com um estilo mais “maneiro”, tendência da moda. Nasce o Capoeira Wear. O silk screem está bombando, surgem camisas e camisetas.
Os eventos passam a ser todos com camisas iguais (o cara não tinha aluno bom e os amigos alinhavam em nome da capoeira)
Aí em Niterói, ou na Trindade, não sei onde foi a conversa, Rogério Loureiro de Carneiro, O Mestre Moreno (não sei se já era mestre nesta época), 1º Mestre formado da Angonal, saca a onda de pintar nas cordas da senzala as cores do Cordel. A galera tinha muito aluno, haja saco para fazer cordel. Corda dá trabalho, mas cordel dá mais.
Concluindo
A partir dos anos 80 perdeu-se a ética, que existia sim, vi muito mestre se juntar e fechar academia de aluno incompetente. Mas, quando as federações deram papeis, era lei. Eu vi federação mandar fechar casa de Mestres competentes que não queriam entrar na palhaçada que reinava.
O fenômeno no início de 1980 expandiu. A capoeira passa de centenas para milhares.
Aí chega o século XXI
Google que pariu!!!!! O êxodo para o exterior. Grupos disputando quem tem mais bandeira de país na camisa. O tráfico de material de capoeira para fora do país, tanto que hoje em dia fica difícil trazer qualquer coisa.
Caras com meses assumindo grupos, capoeiristas que vêm, queimam o filme e vão embora. Estrangeiros montando grupos, apoiados pela lei do seu país, e que nem querem ver mestre brasileiro como referência.
A capoeira chega a mais de 150 países. De milhares viram milhões. Milhões de escritores, compositores, inventores, criadores e bilhões de copiadores da média. Mas, dentre milhões, existe quem resista e trabalhe sério. FELIZMENTE A MÉDIA ESTÁ USANDO O TERMO ANCESTRALIDADE.
Para fechar, normalmente quando se faz workshop, oficinas, vivência (convivência), separa-se os grupos em turma de: INICIANTES, INTERMEDIÁRIOS, AVANÇADOS E PROFISSIONAIS.
Olha os quatro, criança, jovem, adulto e velho. “
E você, o que acha desse tema? Na próxima semana eu trago a opinião de outros mestres sobre a unificação das graduações. Não perca a gente de vista, siga o Blog Capoeira de Toda Maneira nas redes sociais.
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