“Na onda do berimbau /
agitarei no Carnaval…”
OSVALDO NUNES (1965)
De repente, surgem na tela do PC da lanhouse aqui do município as imagens do vídeo “12 Horas de Capoeira”… curioso isso, novamente com a presença só de adultos, homens quase todos — tem um “verme gordo” entre êles — e praticamente mulher alguma. Pelo visto, os modernos tempos dela não interessam mais à garotada, Roda com 12 ou 15 berimbaus (?!), nenhum pandeiro… atabaque, nem pensar ! Segundo alguns evangélicos, “abre as portas do Inferno para os anjos do Mal”. Será que Lúcifer sabe disso ?!
É claro que ninguém quer andar com aquele “trambolho” nas costas, mas daí a ELIMINÁ-LO é um exagero. Eventos oficiais daquele porte e os tais “Batizados” — pra mim terá sempre este nome ! – exigem a “bateria” (ou “cozinha” ou seja lá que nome tenha agora) completa e dentro dos Fundamentos (?!), supondo-se que a Capoeira os tenha ! “Traduzindo”… 3 berimbaus diferentes, pandeiro, atabaque e, talvez, “ganzá”, o pouco visto reco-reco. Caxixi não mão de tocador é artigo raro e berimbau “de taquara”, bambu, é ainda mais difícil de se ver, felizmente. Alunos usavam “vareta” de bambu, que “se gastava”, poía, no local da batida. “Baquetas” grandes demais incomodam, moedas ou arruelas com furo no meio são um suplício, ninguém merece… a medida da vareta era/foi de “1 palmo e 4 dedos” do tocador, sem verniz (que sai com o suor), passava-se as costas de uma vela nela toda.
Tudo isso é coisa do Passado, como o “capoeira” antigo também é ! “Meter-se” entre os atuais praticantes, só se fôr para “passar vergonha” ! Filmagem recente nos exibe “mestre velho” que já não sabe mais sair de um “martelo” e assusta-se (?!) com “queixada” ou “armada”, mais preocupado com o chapéu do que com os golpes que recebe. Tenham a santa paciência… a Capoeira nos cobra bom-senso, já que não pode nos dar “vergonha na cara”
O quanto sabiam os praticantes dos anos 70 ?! Uns 15 ou 20 movimentos dos 30 ou 35 existentes. (Leia-se Lamartine P. da Costa para conhecê-los todos.) Quanto sabem os jovens atuais ?! Mais de 30, talvez 40, de 60 ou 80 novos movimentos, que exigem deles mais VELOCIDADE, mais destreza corporal, resistência física e preparo muscular. Os antigos jogavam por distração, passatempo, após um dia inteiro (ou semana) de trabalho duro. Hoje a juventude treina hora e meia todos os dias, descansada, e vai para as Rodas tensa, pronta para disputas e não lazer. Creio que os antigos aproveitaram melhor seus tempos na Capoeira, pois nela fizeram AMIGOS que os acompanham até hoje. Vejo jovens “capoeiras” talentosos, merecendo seus títulos e troféus… mas andam sozinhos ! Os que entraram nela nos anos 70 e 80 aprenderam a tocar pelo menos 5 ritmos, senão 6, no berimbau e não “atravessam” no atabaque ou pandeiro. Também cantam melhor — pelo menos se ouve seu canto — que a rapaziada moderna, que precisa de microfone para se fazer ouvir. Não é regra geral, tem antigos que “dão vexame” quando abrem a boca !
É preciso NÃO ABANDONAR a música, ela é a ALMA da Capoeira… quem já treinou sem canto ou som sabe do que estou falando ! Antigamente os professores “escalavam” 3 ou 4 alunos para “sustentar o som” enquanto os demais treinavam. E havia AULAS de toque, também !
Na Era da Comunicação desconheço como a Capoeira está sendo ensinada, mas vejo no YouTube vídeos para tudo, auto-explicativos, para se “aprender em casa”. Em longínquos tempos “uma imagem valia por mil palavras”, o Mestre raramente falava, ensinava pelo exemplo, quem estivesse prestando atenção aprendia. No berimbau do professor ninguém mexia, era sagrado… aprendia-se a tocar num outro qualquer, a maior parte dos alunos tinha o seu em casa, para desespero de pais e vizinhos. Os 3 toques básicos todos sabiam, o de Angola era pouco tocado, a maioria preferia o São Bento Grande. Além destes, “Cavalaria” e “Samba de Roda”… não serviam para jogo, mas treinavam o aluno nas ‘VIRADAS”, essenciais para acompanhar os dois S. Bento. Depois vinham o “Panha a laranja” e “Santa Maria”… dizem que é o mesmo toque com 2 nomes; este comentário vale para “Idalina” e “Banguela”, que alguns falam “Benguela”. Finalmente, os mais dedicados aprendiam também o “Iúna” — para jogo de mestres ou alunos formados — e um certo “Amazonas”, que poucos sabem como era. Tive-os todos gravados em fita cassette por meu amigo “RUBINHO Tabajaras”, alguns LPs da época traziam boa parte deles. Ouvi dizer que o toque “Iúna” era usado no enterro de um mestre ! (*1)
Todo este rico acervo de conhecimentos vem se perdendo, ignorado pelos mais jovens e, aos poucos, sendo esquecido pelos mais antigos, a ponto de eu ter presenciado um suposto mestre em 1990 — hoje “paparicado” aqui em Belém, desconheço o motivo — usando toca-disco com defeito na rotação para “animar” sua aula ! E é uma “praga” dessas que formara — creio eu que nem aulas dá — alunos que serão mestres, adiante.
Deixei de fora da relação o “toque de S. Bento da REGIONAL”… esse toque surgiu na Zona Sul carioca lá pelos anos 70, mas foi criado (nos anos 40 ?) por mestre “BIMBA”. Me parece que os Grupos da Zona Norte usavam o S. Bento tradicional. Frequentei poucas vezes a academia de mestre “Peixinho”, na Travessa Angrense, nos sábados e não me lembro do uso dele nas famosas “Rodas Livres” lá. Suponho que teria sido mestre “Camisa” — já no CEU-Casa do Estudante Universitário ou no Clube Guanabara — o divulgador da “novidade” ! Não estou afirmando nada ! “Na Bahia tem, / vou mandar buscar / berimbau de ouro, / ferro de engomar” ! Nem mesmo os “corridos” antigos resistem ao avanço dessa modernidade (?!) que tudo “destrói” !
“NATO” AZEVEDO (em 10/jan. 2021, 15hs)
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OBS: (*1) EM VIDEO DE FINS DOS ANOS 80 (1988? 90?) num Batizado de mestre “Canjiquinha” em Salvador, este nos apresenta um certo “Muzenza”, toque que reproduz o som dos atabaques do Candomblé. Afirma que era usado para a “Capoeira-luta”, isso na academia dele. Meu irmão argumenta que o “IÚNA” repete o toque de tambores chamado de ANGOLA, no Candomblé… nada sei a respeito
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